O Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou remarcação de prova à candidata que se encontrava em estágio avançado de gravidez na data de aplicação dos exames para o Concurso de Outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de Alagoas.
Pela decisão, a comissão do certame deverá remarcar os exames da candidata, de forma presencial e nos mesmos termos proporcionados aos demais candidatos, no prazo mínimo de 45 dias corridos entre o dia do parto e a nova data de realização da prova.
A decisão foi tomada nesta terça-feira (31/10), durante a 16ª Sessão Ordinária do órgão em 2023, no Procedimento de Controle Administrativo (PCA) n. 0006510- 53.2023.2.00.0000. Após a aprovação da liminar, o Plenário do CNJ transformou a medida cautelar em definitiva.
Em seu voto, o relator do processo, conselheiro Marcos Vinícius Rodrigues, analisou a pertinência do princípio constitucional da isonomia, assim como o da dignidade humana, e defendeu a preponderância do segundo, que abarca outros diretos, como o direito ao planejamento familiar e a proteção à família.
“A proteção à gestante, à família e à liberdade reprodutiva são direitos de cunho fundamental, incorporados constitucionalmente ao patrimônio jurídico das mulheres, bem como da própria sociedade, indiretamente”, explanou o relator. Ele considerou a situação da candidata “excepcionalíssima, à vista da data de realização do parto, que coincidiu com a semana de realização das provas, situação que autoriza, de forma extraordinária, a concessão da liminar”.
Obstáculos à realização da prova
As provas foram realizadas em 22 de outubro e a data estimada do parto dessa candidata estava prevista para o dia 18 do mesmo mês – o parto da candidata ocorreu no dia 10 de outubro. Somada à proximidade dos dias, ela apresentou recomendação médica de afastamento das atividades profissionais, inclusive com impossibilidade de viajar no período da prova. Ela reside no município de Timon (MA) e os exames seriam aplicados na capital alagoana.
Durante a sessão plenária do CNJ, o relator afirmou que o voto proferido reconhece um direito fundamental diante da clara discriminação existente no mercado de trabalho relacionada a mulheres em situação de gravidez ou mesmo daquelas que têm filhos pequenos.
“Uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) revela que, após 24 meses, quase metade das mulheres que tiram licença maternidade padrão não estão mais presentes no mercado de trabalho. Realidade que perdura até 47 meses depois”, destacou. O magistrado citou, ainda, outra pesquisa, dessa vez feita na Holanda, em que 50% das mulheres revelaram sentir medo de relatar dificuldades ou atividades com filhos por conta da discriminação existente no mercado de trabalho.
A decisão também considerou resolução do CNJ que determina a adoção da perspectiva de gênero nos julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário para a superação de obstáculos que impossibilitem a concretização de igual dignidade entre mulheres e homens, em todos os cenários da vida pública e privada. Dessa forma, o relator defendeu que, ao não ser considerada a condição especial da mulher gestante ou lactante no livre acesso aos cargos, empregos e funções públicas, a desigualdade entre homens e mulheres seria mantida.
O conselheiro também rememorou que no julgamento de outro PCA, de n. 0006779-97.2020.2.00.00006, o Plenário havia reconhecido liminar, que, por iguais fundamentos, determinava a necessidade de tratamento diferenciado para a candidata gestante. Assim, ele entendeu que o precedente se aplica à liminar concedida, “uma vez que o estágio avançado de gravidez da candidata impedia a realização da prova escrita e prática na data marcada pela comissão do concurso”, finalizou.
A decisão ocorreu por maioria de votos, tendo sido vencido os conselheiros Vieira de Mello Filho, Salise Sanchotene, Giovanni Olsson e o presidente do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso.
/Agência CNJ